Em que relógios ficaram perdidas minhas horas ?

 

 Começo minha escrita com os olhos voltados para Aquele que nos concede a vida. Agradeço aos meus pais, meus irmãos, meu filho Hécio Sodré, minha nora Naryelle e minha neta Maitê. E tinha razão Mario Quintana ao dizer: “A vida é o dever que nós trouxemos, quando se vê já terminou o ano, quando se vê passaram 60 anos...”. Assim celebro minha passagem neste plano em que me evidencio. Sou Nilma da Silva Sodré, natural de Urbano Santos, filha de José Lourenço Sodré e Raimunda da Silva Sodré. Dentre os irmãos, sou a terceira. Fui alfabetizada em escolas públicas, onde também concluí todo o ensino fundamental e médio. Fui mãe aos 21 anos, numa fase de amadurecimento e aprendizados para exercer meu papel de mãe e pai, embora contasse com o apoio de meus pais e irmãos. Nesse período, especialmente em 1992, saindo de uma relação conturbada, vivi momentos de aflições, sentimentos de derrota e baixa autoestima. Foi também o ano em que fui aprovada para a função de professora no primeiro concurso público promovido por nosso estado. Com pouca experiência, mas muita boa vontade, fui vencendo e aprendendo a compartilhar ensinamentos.

 

Com isso, em 1993, mais uma vez com oportunidade ofertada pelo estado, tive a chance, através de vestibular, de ingressar na Universidade Estadual do Maranhão, no curso de Letras, em vagas exclusivas para professores em exercício. Era um curso intensivo em períodos de férias. Celebrei com muita alegria mais essa vitória. Foram alguns anos de idas e vindas, apertos físicos e emocionais, restrições, dificuldades em algumas disciplinas, notas baixas e uma vontade constante de desistir. Foram quatro anos, e mais um até a defesa da monografia. Época de muita acolhida por parte de meus pais e irmãos. Uma fase boa, mas também difícil, na qual fiz novos amigos, realizei muito estágio, aproveitei boas chances e, aos poucos, compreendi o sentido da superação.

 

O tempo passou e a mim foram ofertadas algumas conveniências. Entre elas, destaco o fato de minha madrinha, professora Nona Oliveira, em 1997, mesmo vindo de uma campanha contrária, me enxergar para assumir a função de gestora de uma escola. Na época, percebi que, apesar do discurso de carta branca, todas as decisões, por menores que fossem, precisavam passar por sua autorização. Após dois anos, decidi renunciar. Custou-me caro: ameaças verbais, medos, desatinos e até ofensas direcionadas ao meu pai. Contudo, talvez tenha sido a melhor escolha naquele momento. Embora tenha soado como arrogância, foi uma tomada de consciência política que me trouxe maior conhecimento e uma postura de representatividade.

 

De alguma forma, já ultrapassei muitos percalços e, no cotidiano, trago sementes de vitória. Abracei a oportunidade de ser promotora de leitura, com formações, rodas de leitura e compartilhamento de livros. Sem uma orientação prévia, publiquei meu primeiro livro em 2006, com recortes do meu dia a dia. Não patenteei grandes feitos, mas sei que não fui omissa nos projetos em que me comprometi. Em 2001, despertei a ira de uma autoridade local quando surgiram vagas para professor de Telensino em nossa cidade, programa do governo do estado. Não fui selecionada, mas, para minha alegria, fui chamada para a cidade de Belágua, que me acolheu tão bem. Lá aprendi muitas coisas, conheci estradas, pessoas, políticos e amigos, e aprendi a distinguir verdadeiros amigos. Cada viagem me trazia cenas duvidosas na mente. Até que, no início de 2002, mais uma vez apta ao concurso do estado, fui aprovada para a disciplina de Língua Portuguesa, compondo as primeiras turmas de Ensino Médio em nosso município. Fomos pioneiros.

Percebi que cabia mais gratidão. Outras pessoas tentaram o mesmo concurso e não obtiveram êxito. Posso dizer que, especialmente naquele ano, recebi respostas vindas do Criador. Eu precisava me comprometer em oração e gratidão. Recebia tanto, tanto! Presentes que me ajudavam a compreender que “nada era meu, embora estivesse sob meus cuidados”. Parei para agradecer.

 

Hoje compartilho parte dessa trajetória, marcada por cicatrizes, estruturas enfraquecidas e bloqueios que não combati. Persisti, descobri características que me chamavam ao protagonismo, vivi divisores de águas, conheci dezenas de pessoas que me colocaram em campo: amigos de promessas e amigos de permanência. Caminhos que percorri "sozinha", mas que fortaleceram minha fé. A verdade é que nunca estive só.

 

Em 2013, com chances vindas através de companheiros de partido — Júlia, Iran, Wilson, Clemilton, Paulo, Raimundo —, e com o aval de Dona Iracema Vale, ampliei minha linha de protagonismo. Exerci o cargo de Secretária Municipal de Educação, numa fase de contemporaneidade com tantos profissionais bons, rompendo limites, abrindo turmas para cursos superiores, criando condições para que colegas pudessem ser formadores e revelassem seus potenciais. Foram oito anos de muito aprendizado, registros, amizades e posicionamento. Ao encerrar o ciclo, entendi que havia deixado minha contribuição. Tudo é troca. Quanta gratidão!

 

Em 2021, um ano difícil, marcado pela perda de nosso pai, pelo luto e pela minha contaminação por COVID poucos dias depois, fui chamada à resiliência e à ressignificação. Em 2022, compreendi mais sobre autoconfiança, política, amizades, propósitos e missão. Recriei enredos, me fortaleci em cada conquista e percebi o quanto a proteção divina sempre esteve presente. Hoje, tenho quatro livros autorais, participei de três antologias, sou membro fundadora da Academia de Letras de minha cidade e membro correspondente de mais três academias circunvizinhas. Faço parte de uma equipe de ciclismo, na qual motivo e promovo eventos com frequência.

 

Assim, reforço diariamente meu protagonismo feminino. Minha missão nesta terra tem sido oferecer suporte, incentivo, servir de ponte e cultivar a cultura. Que eu continue corajosa, como me disse  Norma Silva com disposição para despertar outras centenas de mulheres a conquistarem seus espaços e compreenderem seus potenciais. Que, nessa troca, sejamos muito mais que um simples cadastro de pessoa física, mas mulheres vitoriosas aos olhos Daquele que cuida de nós todos os dias.

 

Este é o meu relógio, e os nossos tempos não dependem somente de nós.

 



 


 

 

 


Um comentário:

Cristiane Vieira disse...

Maravilhosa 👏👏quanta sabedoria com as palavras, muito sucesso e longevidade... Deus abençoe

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